Aproximados duzentos e quarenta e seis
quilômetros e um sol ardente de quase
quarenta e dois graus.
Chegamos ao nosso destino, felizes e ao mesmo
tempo ansiosas por não sabermos o que iríamos encontrar.
Bom, na verdade sabíamos.
Ele reclamava de calor, de sede e fome.
Pela janela do quarto chorei ao vê-lo pela
primeira vez. Ele sorriu.
Por quatro horas, esperei no carro, ouvindo
uma boa música e emocionada pela situação...
Logo eu entrara no quarto, recebida por mais
outro sorriso, meio canto de boca como quem não tem mais força pra viver, mas
que ainda lutaria para esse fim. Apresentei-me:
- Oi, tudo bem? Como se alguém pudesse estar
bem depois de dois meses internado. Ainda assim ousou a responder-me que sim,
sempre, sempre acompanhando a tentativa de um sorriso.
Faltava fôlego mais perguntou meu nome.
-Paula. Ana
Paula!
-Nome bonito.
Sorri também.
Falamos sobre quase tudo até que ele perguntou
se eu ainda estudava.
- Faço técnico
em Arte Dramática e logo mais pretendo começar a fazer fotografia, gosto de
arte!
Ele, com um ar descontraído, acho que querendo
escapar da realidade brincou:
- Uma menina
arteira?!
Sorrimos por cinco segundos exatos,
faltava-lhe o ar. Pediu desculpa pela situação e eu não tinha o que fazer, uma
vez que a única vontade era chorar...
Ele estava ali não só pela idade que traz suas
consequências, mas pelo cigarro nosso que fumamos a cada dia querendo
amenizar/saciar qualquer agonia ou vício da vida.
Arrisquei outra brincadeira.
-Quanto tempo!
De repente o senhor sumiu... Mas de vinte anos, eu acho!
-É a vida
minha filha, a vida. E não me arrependendo de nada que tenho feito dela!
Senti vontade de viver na mesma intensidade
que ele apresentava-me ter vivido.
Nada de mulheres, nenhuma das tantas que tivera
com a vida de caminhoneiro. Nem filhos, dos três que acho que tem. E por ele
ninguém, pelo fato de não ter que depender ou dar algum tipo de trabalho.
Orgulho. Acho que por ele, morreria naquela cama de hospital sozinho assim como
chegara até ali.
Orgulho!
A noite chegava trazendo uma brisa boa, mais
pra chuva do que pra brisa e eu ali ainda sem saber o que esperar dos quatro
dias restantes que eu passaria com ele!
Fumei dois cigarros tentando descrever os dias
que faltavam, mas como prever o amanhã?
Choveu forte, como se algo quisesse tirar meus
pensamentos dessa situação, então, fechei a agenda velha rabiscada de meus
traços e decidi viver um dia de cada vez com ele ali procurando o cheiro da
chuva sorrindo de canto de boca com um olhar que brilhava fosco e piscava
lento.
Disse que precisava ir, tomar um banho, comer.
Descansar. Beijei sua testa enquanto apertava minha mão, de dor, acabara de
tirar sangue para novos exames. Uma lágrima caiu e aí ele me agradeceu.